Caminhos da medicina
As descobertas sobre a fisiologia da respiração são um exemplo típico de como evolui o conhecimento científico, por etapas, graças à contribuição de sucessivos pesquisadores, até que se torne possível decifrar o enigma com que a Natureza desafia a inteligência humana.
A medicina egípcia já assinalava a necessidade de respirar para preservação da vida e admitia a existência de alguma coisa no ar que vivifica e anima todas as partes do corpo. Diferenciava o alento da vida (ar inspirado), do alento da morte (ar expirado), concluindo que algo contido no ar se dissemina por todo o corpo através dos vasos sanguíneos procedentes do pulmão.
Na medicina hebraica a importância da respiração para a manutenção da vida é ressaltada no livro dos Salmos (104.29): "Se lhes tira a respiração, morrem, e voltam para o seu pó."
Entre os filósofos gregos, Anaximenes (570-500 AC) considerava o ar o principal elemento da criação e sustentáculo da vida animal. Para a escola hipocrática, o calor corporal é inerente à vida e para a conservação do calor é necessária a respiração, que introduz no corpo o pneuma, elemento vital contido no ar. A respiração leva o pneuma até os pulmões e, destes, ao ventrículo esquerdo, de onde é transportado pelas artérias a todas as partes do organismo.
Na Idade Média, Leonardo da Vinci registrou, em um de seus cadernos de nota, que a chama de uma vela se apaga na ausência do ar.
Robert Boyle (1627-1691), físico inglês, confirmou a observação de Da Vinci, extraindo o ar de dentro de uma redoma de vidro por meio de uma bomba de aspiração. Verificou que a vida era impossível na atmosfera rarefeita dentro da redoma e que um pequeno animal ali colocado morria rapidamente. Portanto, alguma coisa havia no ar que alimentava ao mesmo tempo o fogo e a vida.
John Mayow (1643-1679) repetiu as experiências de Boyle e constatou que, quando se coloca ao mesmo tempo, dentro da redoma, um camundongo e uma vela, reduz-se pela metade o tempo necessário para apagar a chama e para a morte do animal. Ficou evidente que a porção de ar que alimentava a chama era a mesma que mantinha a vida. Tentou, a seguir, queimar um fragmento de cânfora no interior da redoma, após a extração do ar, fazendo convergir sobre o mesmo os raios solares concentrados por meio de uma lente. A combustão da cânfora só se processava quando se adicionava à mesma uma pequena quantidade de salitre (nitrato de potássio), substância empregada na fabricação da pólvora.
Mayow concluiu que o nitrato contém a mesma substância existente no ar, necessária ao fogo e à vida. Chamou a esta substância spiritus nitroaereus. Em suas primeiras publicações, aos 25 anos de idade, Mayow combateu a teoria vigente desde o tempo de Galeno, de que o ar inspirado destinava-se a refrigerar o coração, e afirmou que a cor vermelha do sangue arterial se devia ao seu maior conteúdo em "ar do fogo" e que este era necessário para manter o calor do corpo.. Mayow faleceu aos 36 anos de idade e seus trabalhos foram ignorados por quase um século.
Georg Stahl (1660-1734), no início do século XVIII, lançou a teoria flogística, segundo a qual todas as substâncias que se queimam têm na sua constituição um elemento comum, o flogisto, verdadeiro fogo latente, que se desprende durante a combustão. Esta teoria teve grande influência no pensamento médico, na interpretação da febre e da inflamação, que seriam causadas pela liberação dessa hipotética substância.
Inflamar provém do latim inflammare, que significa "por em chamas". Data dessa época a denominação de antiflogístico, usada até hoje para designar as substâncias ou medicamentos dotados de ação antiinflamatória.
Joseph Black (1728-1799), professor de Química em Glasgow, na Escócia, descobriu em 1757 que havia no ar atmosférico um gás com a propriedade de turvar a água de cal. Chamou a esse gás de "ar fixo" e o identificou-o ao "gás silvestre" descoberto por Van Helmont um século antes. Verificou que o ar expelido pelos pulmões era mais rico deste gás do que o ar atmosférico, e que o mesmo também se formava com a queima do carvão.
Em 1766 Cavendish isolou o hidrogênio. Henry Cavendish (1731-1810) era um físico e químico inglês descendente de família nobre e muito rico. Dedicou toda a sua vida à pesquisa científica e foi um dos pioneiros no estudo dos gases atmosféricos. Era um misantropo que evitava contato com as pessoas, inclusive parentes. Nunca se casou e sua convivência se limitava aos membros da Royal Society, a que pertencia, e onde comunicava as suas descobertas. Dentre elas, uma das mais importantes foi a identificação do hidrogênio, a que chamou de "ar inflamável". Por meio de uma centelha elétrica obteve a síntese da água, combinando o "ar inflamável" com o "ar do fogo", ou seja, o hidrogênio com o oxigênio, que ele chamava de "ar vital". Muitas de suas descobertas permaneceram desconhecidas de seus contemporâneos e só foram divulgadas muitos anos após sua morte.
O nitrogênio foi identificado independentemente por Scheele, Priestley e Rutherford em 1772.
A esta altura, portanto, já haviam sido isolados o gás carbônico, o hidrogênio e o nitrogênio. Faltava ser identificado o oxigênio, até então chamado "ar do fogo" ou "ar vital".
O oxigênio foi finalmente isolado, ao mesmo tempo, por Scheele e Priestley.
Carl Wilhelm Scheele (1742-1786), de nacionalidade sueca, era farmacêutico e fazia suas experiências em um pequeno laboratório nos fundos da farmácia onde trabalhava, na cidade de Upsala. Obteve o "ar do fogo" a partir do óxido de magnésio e, a seguir, do óxido de mercúrio. Observou que os animais colocados no recipiente onde era coletado o "ar do fogo", lentamente o transformavam em "ar fixo" (gás carbônico).
Scheele deixou-se influenciar pela teoria flogística que dominava o pensamento científico na época e acreditava que a produção do calor se devia à liberação do flogisto, que se unia ao "ar do fogo". Scheele faleceu aos 43 anos de idade, dois dias após o seu casamento com a viúva do antigo dono da farmácia, convencido do acerto da teoria flogística.
Joseph Pristley (1733-1804), em Birmigham, na Inglaterra, também isolou em 1772 o "ar do fogo", aquecendo diversas substâncias químicas. Notou que a chama era mais brilhante com o "ar do fogo" puro do que com o ar atmosférico. Explicou a combustão, do mesmo modo que Scheele, como resultado da liberação do flogisto contido nos corpos e sua união ao "ar do fogo". A queima de uma substância nada mais era, segundo Priestley, do que a retirada pelo gás, do flogisto, que se libertava (flogisto livre).
A respiração para ele tinha por fim levar o "ar do fogo" ao interior do organismo a fim de retirar do sangue o flogisto liberado pelos alimentos. A cor escura do sangue venoso seria devida ao maior teor de flogisto e a cor vermelha do sangue arterial ao processo de desflogistificação, isto é, à retirada do flogisto pelo ar dos pulmões.
Priestley era um sacerdote e teve de fugir da Inglaterra para os Estados Unidos por suas convições religiosas. Enquanto viveu manteve sua crença na teoria flogística.
Coube a Lavoisier decifrar o quebra-cabeças armado por seus antecesssores. Ele o fez desfechando um golpe mortal na teoria do flogisto.
Antoine Laurent Lavoisier (1743-1794), o fundador da química moderna, era descendente de família rica. Nasceu em Paris e teve educação esmerada. Primeiramente estudou direito, porém desde cedo sentiu-se atraído pela investigação científica e montou seu próprio laboratório. Aos 25 anos já era membro da Academia de Ciências da França, quando se casou com Marie-Anne Paulze, de 13 anos de idade, filha do Diretor da Companhia das Indias.
Inicialmente verificou que o óxido de ferro, quando aquecido, se transformava em ferro, perdendo peso e liberando gás com as mesmas propriedades do "ar do fogo", Chamou a esse gás oxigênio (que produz ácido). Concluiu que o fenômeno da combustão deveria ser interpretado ao contrário do que ensinava a teoria flogística: em lugar de perder flogisto, elemento imaginário que não deveria existir, os corpos quando se queimam, ou se oxidam, absorvem oxigênio.
Teve a intuição de que o calor animal resultava de uma combustão interna, lenta, na qual seria consumido o oxigênio do ar inspirado, e desprendido o "ar fixo", que identificou ao gás carbônico (CO2). Atribuiu a cor vermelha do sangue arterial ao oxigênio e a cor escura do sangue venoso ao gás carbônico. Comparou a produção do calor animal à queima do carvão, em que há consumo de oxigênio e produção de gás carbônico e água.
Pierre Simon Laplace (1749-1827), matemático francês e amigo de Lavoisier, submeteu esta hipótese a uma análise matemática, comparando a quantidade de gás carbônico eliminado com o calor produzido por um animal, no mesmo período de tempo. A seguir mediu o calor e o gás carbônico produzido pela combustão de uma certa quantidade de carvão. Concluiu Laplace que o calor produzido, tanto num como noutro caso, é proporcional ao consumo de oxigênio.
Lavoisier acreditava, e este foi o seu único erro, que a combustão se desse nos pulmões, onde o sangue entraria em contato com o ar inspirado, e que o calor gerado nos pulmões seria distribuído pelo sangue a todo o corpo.
Lavoisier, considerado um dos maiores gênios de todos os tempos, foi condenado pela Revolução Francesa de 1793 a morrer na guilhotina, aos 5l anos de idade, por suas ligações com a realeza, tendo sido decapitado em 8.5.1794.
A idéia de Lavoisiser de que a combustão se desse nos pulmões foi refutada por Lagrange.
Joseph Louis Lagrange (1736-1813), matemático e astrônomo francês, com base em cálculos matemáticos, demonstrou que se a combustão ocorresse somente nos pulmões, a produção local de calor seria tão intensa que lesaria o parênquima pulmonar. Defendeu a idéia de que o consumo de oxigênio e a produção de gás carbônico se daria em todos os órgãos, realizando-se nos pulmões apenas a troca de gases, o que foi confirmado posteriormente.
Gustav Magnus (1802-1870) químico e fisiologista alemão, dosou pela primeira vez o oxigênio e o gás carbônico no sangue arterial e venoso, comprovando, assim que a utilização de oxigênio e eliminação de gás carbônico se passa na intimidade dos tecidos.
A decifraçào do enigma da respiração resultou, assim, das investigações realizadas por cinco físicos, um farmacêutico, dois químicos e dois matemáticos, cabendo o maior mérito, sem sombra de dúvida, a Lavoisier.
Ironicamente, o único médico que participou dessa empreitada, que foi Stahl, o fez em sentido negativo, lançando a teoria do flogisto, elemento imaginário criado pela fantasia, sem nenhuma base científica, e que dificultou a compreensão do liame existente entre a respiração e a produção do calor animal.
Houve grande resistência do mundo científico em abandonar a teoria flogística e aceitar as novas idéias de Lavoisier, que representaram uma revolução só comparável à descoberta da circulação por Harvey.
Joffre M. de Rezende
Professor Emérito da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Goiás
Membro das Sociedades Brasileira e Internacional de História da Medicina
e-mail: jmrezende@cultura.com.br
http://usuarios.cultura.com.br/jmrezende
dez/2000. Atualizado em 26/10/2002
http://usuarios.cultura.com.br/jmrezende/respira%E7%E3o.htm
As descobertas sobre a fisiologia da respiração são um exemplo típico de como evolui o conhecimento científico, por etapas, graças à contribuição de sucessivos pesquisadores, até que se torne possível decifrar o enigma com que a Natureza desafia a inteligência humana.
A medicina egípcia já assinalava a necessidade de respirar para preservação da vida e admitia a existência de alguma coisa no ar que vivifica e anima todas as partes do corpo. Diferenciava o alento da vida (ar inspirado), do alento da morte (ar expirado), concluindo que algo contido no ar se dissemina por todo o corpo através dos vasos sanguíneos procedentes do pulmão.
Na medicina hebraica a importância da respiração para a manutenção da vida é ressaltada no livro dos Salmos (104.29): "Se lhes tira a respiração, morrem, e voltam para o seu pó."
Entre os filósofos gregos, Anaximenes (570-500 AC) considerava o ar o principal elemento da criação e sustentáculo da vida animal. Para a escola hipocrática, o calor corporal é inerente à vida e para a conservação do calor é necessária a respiração, que introduz no corpo o pneuma, elemento vital contido no ar. A respiração leva o pneuma até os pulmões e, destes, ao ventrículo esquerdo, de onde é transportado pelas artérias a todas as partes do organismo.
Na Idade Média, Leonardo da Vinci registrou, em um de seus cadernos de nota, que a chama de uma vela se apaga na ausência do ar.
Robert Boyle (1627-1691), físico inglês, confirmou a observação de Da Vinci, extraindo o ar de dentro de uma redoma de vidro por meio de uma bomba de aspiração. Verificou que a vida era impossível na atmosfera rarefeita dentro da redoma e que um pequeno animal ali colocado morria rapidamente. Portanto, alguma coisa havia no ar que alimentava ao mesmo tempo o fogo e a vida.
John Mayow (1643-1679) repetiu as experiências de Boyle e constatou que, quando se coloca ao mesmo tempo, dentro da redoma, um camundongo e uma vela, reduz-se pela metade o tempo necessário para apagar a chama e para a morte do animal. Ficou evidente que a porção de ar que alimentava a chama era a mesma que mantinha a vida. Tentou, a seguir, queimar um fragmento de cânfora no interior da redoma, após a extração do ar, fazendo convergir sobre o mesmo os raios solares concentrados por meio de uma lente. A combustão da cânfora só se processava quando se adicionava à mesma uma pequena quantidade de salitre (nitrato de potássio), substância empregada na fabricação da pólvora.
Mayow concluiu que o nitrato contém a mesma substância existente no ar, necessária ao fogo e à vida. Chamou a esta substância spiritus nitroaereus. Em suas primeiras publicações, aos 25 anos de idade, Mayow combateu a teoria vigente desde o tempo de Galeno, de que o ar inspirado destinava-se a refrigerar o coração, e afirmou que a cor vermelha do sangue arterial se devia ao seu maior conteúdo em "ar do fogo" e que este era necessário para manter o calor do corpo.. Mayow faleceu aos 36 anos de idade e seus trabalhos foram ignorados por quase um século.
Georg Stahl (1660-1734), no início do século XVIII, lançou a teoria flogística, segundo a qual todas as substâncias que se queimam têm na sua constituição um elemento comum, o flogisto, verdadeiro fogo latente, que se desprende durante a combustão. Esta teoria teve grande influência no pensamento médico, na interpretação da febre e da inflamação, que seriam causadas pela liberação dessa hipotética substância.
Inflamar provém do latim inflammare, que significa "por em chamas". Data dessa época a denominação de antiflogístico, usada até hoje para designar as substâncias ou medicamentos dotados de ação antiinflamatória.
Joseph Black (1728-1799), professor de Química em Glasgow, na Escócia, descobriu em 1757 que havia no ar atmosférico um gás com a propriedade de turvar a água de cal. Chamou a esse gás de "ar fixo" e o identificou-o ao "gás silvestre" descoberto por Van Helmont um século antes. Verificou que o ar expelido pelos pulmões era mais rico deste gás do que o ar atmosférico, e que o mesmo também se formava com a queima do carvão.
Em 1766 Cavendish isolou o hidrogênio. Henry Cavendish (1731-1810) era um físico e químico inglês descendente de família nobre e muito rico. Dedicou toda a sua vida à pesquisa científica e foi um dos pioneiros no estudo dos gases atmosféricos. Era um misantropo que evitava contato com as pessoas, inclusive parentes. Nunca se casou e sua convivência se limitava aos membros da Royal Society, a que pertencia, e onde comunicava as suas descobertas. Dentre elas, uma das mais importantes foi a identificação do hidrogênio, a que chamou de "ar inflamável". Por meio de uma centelha elétrica obteve a síntese da água, combinando o "ar inflamável" com o "ar do fogo", ou seja, o hidrogênio com o oxigênio, que ele chamava de "ar vital". Muitas de suas descobertas permaneceram desconhecidas de seus contemporâneos e só foram divulgadas muitos anos após sua morte.
O nitrogênio foi identificado independentemente por Scheele, Priestley e Rutherford em 1772.
A esta altura, portanto, já haviam sido isolados o gás carbônico, o hidrogênio e o nitrogênio. Faltava ser identificado o oxigênio, até então chamado "ar do fogo" ou "ar vital".
O oxigênio foi finalmente isolado, ao mesmo tempo, por Scheele e Priestley.
Carl Wilhelm Scheele (1742-1786), de nacionalidade sueca, era farmacêutico e fazia suas experiências em um pequeno laboratório nos fundos da farmácia onde trabalhava, na cidade de Upsala. Obteve o "ar do fogo" a partir do óxido de magnésio e, a seguir, do óxido de mercúrio. Observou que os animais colocados no recipiente onde era coletado o "ar do fogo", lentamente o transformavam em "ar fixo" (gás carbônico).
Scheele deixou-se influenciar pela teoria flogística que dominava o pensamento científico na época e acreditava que a produção do calor se devia à liberação do flogisto, que se unia ao "ar do fogo". Scheele faleceu aos 43 anos de idade, dois dias após o seu casamento com a viúva do antigo dono da farmácia, convencido do acerto da teoria flogística.
Joseph Pristley (1733-1804), em Birmigham, na Inglaterra, também isolou em 1772 o "ar do fogo", aquecendo diversas substâncias químicas. Notou que a chama era mais brilhante com o "ar do fogo" puro do que com o ar atmosférico. Explicou a combustão, do mesmo modo que Scheele, como resultado da liberação do flogisto contido nos corpos e sua união ao "ar do fogo". A queima de uma substância nada mais era, segundo Priestley, do que a retirada pelo gás, do flogisto, que se libertava (flogisto livre).
A respiração para ele tinha por fim levar o "ar do fogo" ao interior do organismo a fim de retirar do sangue o flogisto liberado pelos alimentos. A cor escura do sangue venoso seria devida ao maior teor de flogisto e a cor vermelha do sangue arterial ao processo de desflogistificação, isto é, à retirada do flogisto pelo ar dos pulmões.
Priestley era um sacerdote e teve de fugir da Inglaterra para os Estados Unidos por suas convições religiosas. Enquanto viveu manteve sua crença na teoria flogística.
Coube a Lavoisier decifrar o quebra-cabeças armado por seus antecesssores. Ele o fez desfechando um golpe mortal na teoria do flogisto.
Antoine Laurent Lavoisier (1743-1794), o fundador da química moderna, era descendente de família rica. Nasceu em Paris e teve educação esmerada. Primeiramente estudou direito, porém desde cedo sentiu-se atraído pela investigação científica e montou seu próprio laboratório. Aos 25 anos já era membro da Academia de Ciências da França, quando se casou com Marie-Anne Paulze, de 13 anos de idade, filha do Diretor da Companhia das Indias.
Inicialmente verificou que o óxido de ferro, quando aquecido, se transformava em ferro, perdendo peso e liberando gás com as mesmas propriedades do "ar do fogo", Chamou a esse gás oxigênio (que produz ácido). Concluiu que o fenômeno da combustão deveria ser interpretado ao contrário do que ensinava a teoria flogística: em lugar de perder flogisto, elemento imaginário que não deveria existir, os corpos quando se queimam, ou se oxidam, absorvem oxigênio.
Teve a intuição de que o calor animal resultava de uma combustão interna, lenta, na qual seria consumido o oxigênio do ar inspirado, e desprendido o "ar fixo", que identificou ao gás carbônico (CO2). Atribuiu a cor vermelha do sangue arterial ao oxigênio e a cor escura do sangue venoso ao gás carbônico. Comparou a produção do calor animal à queima do carvão, em que há consumo de oxigênio e produção de gás carbônico e água.
Pierre Simon Laplace (1749-1827), matemático francês e amigo de Lavoisier, submeteu esta hipótese a uma análise matemática, comparando a quantidade de gás carbônico eliminado com o calor produzido por um animal, no mesmo período de tempo. A seguir mediu o calor e o gás carbônico produzido pela combustão de uma certa quantidade de carvão. Concluiu Laplace que o calor produzido, tanto num como noutro caso, é proporcional ao consumo de oxigênio.
Lavoisier acreditava, e este foi o seu único erro, que a combustão se desse nos pulmões, onde o sangue entraria em contato com o ar inspirado, e que o calor gerado nos pulmões seria distribuído pelo sangue a todo o corpo.
Lavoisier, considerado um dos maiores gênios de todos os tempos, foi condenado pela Revolução Francesa de 1793 a morrer na guilhotina, aos 5l anos de idade, por suas ligações com a realeza, tendo sido decapitado em 8.5.1794.
A idéia de Lavoisiser de que a combustão se desse nos pulmões foi refutada por Lagrange.
Joseph Louis Lagrange (1736-1813), matemático e astrônomo francês, com base em cálculos matemáticos, demonstrou que se a combustão ocorresse somente nos pulmões, a produção local de calor seria tão intensa que lesaria o parênquima pulmonar. Defendeu a idéia de que o consumo de oxigênio e a produção de gás carbônico se daria em todos os órgãos, realizando-se nos pulmões apenas a troca de gases, o que foi confirmado posteriormente.
Gustav Magnus (1802-1870) químico e fisiologista alemão, dosou pela primeira vez o oxigênio e o gás carbônico no sangue arterial e venoso, comprovando, assim que a utilização de oxigênio e eliminação de gás carbônico se passa na intimidade dos tecidos.
A decifraçào do enigma da respiração resultou, assim, das investigações realizadas por cinco físicos, um farmacêutico, dois químicos e dois matemáticos, cabendo o maior mérito, sem sombra de dúvida, a Lavoisier.
Ironicamente, o único médico que participou dessa empreitada, que foi Stahl, o fez em sentido negativo, lançando a teoria do flogisto, elemento imaginário criado pela fantasia, sem nenhuma base científica, e que dificultou a compreensão do liame existente entre a respiração e a produção do calor animal.
Houve grande resistência do mundo científico em abandonar a teoria flogística e aceitar as novas idéias de Lavoisier, que representaram uma revolução só comparável à descoberta da circulação por Harvey.
Joffre M. de Rezende
Professor Emérito da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Goiás
Membro das Sociedades Brasileira e Internacional de História da Medicina
e-mail: jmrezende@cultura.com.br
http://usuarios.cultura.com.br/jmrezende
dez/2000. Atualizado em 26/10/2002
http://usuarios.cultura.com.br/jmrezende/respira%E7%E3o.htm
Boa materia... Sou um estudante do quinto ano de medicina. Estou no Internato, período de dois anos que antecede o término do curso. Vou tentar postar diariamente sobre minhas vivências. Manterei o anonimato, assim ficarei mais livre. Participe dos casos clínicos... http://internatomedico.blogspot.com
ResponderEliminarobs.: aberto a parcerias...