Luanda - Faleceu
recentemente, Suzana Kathuñga, uma jovem mucubal (um pequeno grupo étnico
localizado na província da Huíla), que ficou conhecida por estar o
hospital Josina Machel a ter recusado, prestar assistência medica
medicamentosa quando se encontra gravemente doente, em Novembro de 2013.
O Padre Jacinto Wacussanga que no inicio apoiou a evacuação da paciente
da ex- paciente do Hospital Central do Lubango para o Hospital Maria Pia,
em Luanda, dá o seu testemunho nas linhas que se seguem.
Fonte: Jacinto Wacussanga
Club-k.net
A notícia penetrou-me o coração como uma adaga. Fiquei
por momentos silencioso, a contemplar a crueldade do fado. Mas também vieram à
minha memória o estoicismo desta menina de quase 22 anos que quis encarar a
morte face a face. E viu-a a chegar, lenta e dolorosa. Sem pressa.Foi uma
verdadeira odisseia, permeada de esforços verdadeiramente titânicos, com
actores de diferentes latitudes, tentando ajudar a Suzana, alviando a sua dor,
quer psicológica, resultante da rejeição doentia por parte de certos lunáticos
que encontram sossego na discriminação, quer a dor física, a de enfrentar
diariamente algum bicho que lentamente roía sua carne fresca de menina.
A primeira parte da Odisseia iniciou junto de seu
torrão natal, o Tyipeio, onde ela foi encontrada por nós, junto da mãe, a
sofrer desta úlcera cruel que a dilacerava. Contactada a mãe e outros parentes,
todos acederam para que escalasse a Serra da Chela e fosse procurar por
melhores tratamentos. A Secção Municipal da Saúde disponibilizou sua ambulância
e outros meios, para a levar ao Hospital Central. Posta aí, um médico, penso de
origem eslava, atirou na minha cara: "Eu não tenho lugar para esta doente.
Ela está em fase terminal. Prefiro ter cama para um doente que eu sei que vai
ter chances de curar do que ela" Por mais que tentássemos advogar a causa,
debalde! Tendo apelado a amigos, o caso chegou à Direcçaõ Provincial da Saúde
que moveu meios até ela parar em Luanda.
Posta no Hospital Josina Machel, ela literalmente foi
expulsa, tendo de ficar com a uma Congregaçáo de Irmãs (o nome foi omitido para
salvaguardar sua privacidade). Estas, cheias de coragem, acolheram a menina,
enquanto se encontrara uma saída. Responsáveis do Ministério da Educação
tomaram conhecimento do tratamento dado à Suzana e reagiram, tendo chamado à
pedra os fautores. A comunicação social foi crucial para que o caso fosse
dvulgado e conhecido, levando às pessoas e instituições a tomar medidas, todas
convergentes para ajudar a Suzana.
Como que por um milagre,ajudada por tantas mãos, ela
foi parar à caríssima Multiperfil, onde esteve internada durante mais de 10
dias, enquanto se esperava pelo resultado da Biópsia. Ninguém pagou um centavo.
Deus bendiga estes valorosos médicos, que ultrapassaram o limite comum do
tratamento indigno a que o pobre em Angola está votado. O resultado da biópsia
revelou um cancro maligno, que já está a dilacerar seus tecidos há quase três anos.
Foi como que o céu desabasse sobre todos os envolvidos no caso.
Ela voltou à Huíla. Veio sorridente, bonita, cheia de
sorrisos e de tanta gratidão, por tantas mãos, visíveis e invisíveis, a terem
ajudado a chegar tão distante. Instámos com ela, para que ao menos ficasse na
sede municipal dos Gambos, a vila do Chiange, perto do Centro Municipal de
Saúde. Mas ela estava irredutível. Preferia estar perto da mãe, dos parentes e
junto dos Onohande, os espíritos ancestrais, a fim de encarar os próximos dias.
Nos últimos dias, quando fomos levar as sementes de
mandioca e batata-doce ao Fimo, ela estava recolhida na sua casota, mas muto
fraca, a voz trêmula e quase inaudível.
A úlcera tinha avançado tanto que já mal movia os
maxilares. Mas lá estava ela, estóica como sempre, verdadeiramente mukuvale,
upper lip stick, como se fala dos estoicismo dos ingleses.
Até que, rodeado da mãe, do tio Gabriel, aos 17 de
;Maio, expirou.
Fiquei como uma grande dor: ela queria tanto ver a sua
única filhinha, a Savita, mas ao tempo de seu desiderato, o caminho estava
enlameado pelas últimas enxurradas de Abril e a travessia era quase impssível.
Nem sequer reclamou, sabendo dos empeclhos que tal acarretava.
Ela foi-se, preferiu vencer de uma vez por todas a
barreira da dor que a dilacerava, apagando-se para sempre para este mundo e
deixando o lastro lumnoso de sua passagem, através de um sorriso vívido: a sua
única filhinha, a Savita de Fátima, a viver el Luanda com sua querida mamã
adoptiva. Está tão bem adaptada a Luanda e à sua nova família, como que se a
Providência, ao transplantar a árvore, desta para a eternidade, nos legasse
esta lnda semente.
Gostaria de informar a todos quantos quiserem estar
connosco, que em data a marcar, iremos ao Fimo prestar uma singela homenagem a
esta heroína, vencedor da dor e da dscriminação, a Suzana Kathuñga. Paz à sua
alma.
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