Em Junho de 2009, os familiares de
Domingas de Sousa, “Mingota”, procuraram a Televisão Pública de Angola (TPA),
depois de lhes ter sido negada assistência médica no Hospital Américo Boavida.
Antes, haviam passado por outras unidades hospitalares. Foi uma sucessão
infrutífera de idas e vinda até que, em desespero de causa, clamaram por ajuda
através da televisão. Quase em seguida, Mingota morreu na portaria da TPA,
amparada pela inconsolável mãe.
Luísa Rogério
http://www.redeangola.info/opiniao/socorro-estamos-doentes/
Tapou-se o corpo diante das câmaras, mas
o assunto não morreu. A morte em directo, da jovem de 25 anos, teve grande
repercussão. Nasceu assim o chamado “caso Mingota”. A Procuradoria Geral da
República interveio. Uma catalogadora foi identificada como a autora da recusa
de atendimento, acto passível de responsabilidade criminal.
Ao hospital também caberia, nos termos
da lei, a responsabilidade administrativa e civil pelo sucedido. Em função dos
factos, o PGR ordenou a remessa dos autos à Direcção Nacional de Investigação
Criminal (DNIC) para a instauração do competente processo. “Mingota” passou a
ser um caso de polícia.
A PGR convocou os familiares da
malograda para notificação e elucidação quanto aos procedimentos e instrumentos
legais com vista a obtenção da indemnização pelos danos sofridos. Encaminhado
ao tribunal em finais de 2011, o assunto veio novamente ao público na semana
finda.
O hospital Américo Boavida poderá indemnizar a família de Mingota, além de pagar pensão vitalícia à sua mãe pois, aparentemente, esta dependia da filha. São apenas conjecturas suscitadas pelo processo em julgamento, cuja sentença será conhecida no próximo dia 30. Talvez saibamos então porque o hospital universitário atribuiu a uma catalogadora o poder de decidir quem deve ser atendido, o que é estado de saúde grave e urgência.
O hospital Américo Boavida poderá indemnizar a família de Mingota, além de pagar pensão vitalícia à sua mãe pois, aparentemente, esta dependia da filha. São apenas conjecturas suscitadas pelo processo em julgamento, cuja sentença será conhecida no próximo dia 30. Talvez saibamos então porque o hospital universitário atribuiu a uma catalogadora o poder de decidir quem deve ser atendido, o que é estado de saúde grave e urgência.
Na altura em que se volta a falar do
“Caso Mingota” soube de outros que, no mínimo, justificam o questionamento da
qualidade dos nossos serviços de saúde. Uma jovem mãe deu a luz na maternidade
pública. O parto, demasiado longo, não correu bem. O bebé absorveu líquidos que
comprometeriam a sua saúde se não fosse prontamente socorrido.
Acontece que a unidade hospitalar tinha
equipamento considerado de ponta, mas faltava pessoal para manuseá-lo. Quer
dizer, compraram o material e se esqueceram de capacitar o pessoal técnico. A
vida do bebé estava em risco. Apreensivos, os familiares optaram por uma
clínica privada.
Encontraram uma com equipamento e pessoal clínico preparado para fazer o tratamento recomendado. O bebé tinha que ser internado. Era preciso pagar caução e outras despesas. Em tempo útil a família mobilizou recursos. Pagas as contas, restava transferir o bebé.
Encontraram uma com equipamento e pessoal clínico preparado para fazer o tratamento recomendado. O bebé tinha que ser internado. Era preciso pagar caução e outras despesas. Em tempo útil a família mobilizou recursos. Pagas as contas, restava transferir o bebé.
A espera prolongou-se por quatro horas.
Nesse lapso de tempo os familiares viveram a agonia que palavra nenhuma
retrata. Impotentes, assistiram a morte do bebé nos braços do pai. A clínica
que reunia condições para atender ao bebé que entrara em sofrimento no ventre
materno não cumpriu a sua obrigação por falta de ambulância!
Outra ocorrência chocante dá conta da
morte de uma senhora na mesa de operações devido a inexistência de sangue para
transfusão. O procedimento tinha sido previamente programado, o que aumenta a
indignação.
Há também situações caricatas. A cidadã
que viajou de urgência para o estrangeiro devido a uma suposta doença
cancerígena de diagnóstico indefinido é ilustrativo. Bem feitas as contas, não
estava propriamente doente. Tratava-se de uma gravidez, agravada por quadro
denominado hiperêmese gravídica.
Em consequência das náuseas e vómitos
por período prolongado, com causa desconhecida, a insuspeita gestante perdeu
mais de dez quilos em pouco tempo. Talvez por ter idade para ser avó, como lhe
disseram ao pedir explicações, ninguém se lembrou de um simples teste de
gravidez ou de requisitar exames apropriados para averiguar as causas do
estranho quadro clínico com algum inchaço à mistura. No fim tudo correu de
feição para a mãe e para o bebé nascido no país mais a sul do continente.
Ter dinheiro para pagar uma clínica onde
se exige não menos do que quinhentos dólares para dar entrada no banco de
urgência, já não é quanto baste para se ter acesso a um direito elementar.
Procurar assistência médica no exterior tem sido a saída para quem pode. Na
Namíbia e África do Sul, os destinos mais próximos, ou em Portugal, Cuba e
Brasil também procurados em larga escala, muitos angolanos são tratados em
hospitais públicos.
Voltando às urgências, o atendimento
deveria ser obrigatório, inclusive no ramo privado. Em primeira instância o
objectivo da medicina é aliviar o sofrimento humano. Quando a ética, a pauta
deontológica e o Juramento de Hipócrates, feito por médicos e outros
profissionais de saúde são postergados em nome de lucros, a alternativa é pedir
socorro. Estamos gravemente doentes!
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