Medida ocorre em cumprimento da política do Governo, de descentralização de cuidados a doentes HIV-SIDA, mas os recursos estão a diminuir ao mesmo tempo que o financiamento externo ao HIV-SIDA tem estado a cair
Maputo (Canalmoz) - A Organização Não Governamental Médicos Sem Fronteiras, da Bélgica, procedeu, oficialmente, ao encerramento do Hospital de Dia do Centro de Saúde 1º de Maio, na cidade de Maputo. Fê-lo a cumprir ordens do Governo moçambicano que justiça a orientação como de “estratégia”. No âmbito dessa “estratégia do governo”, estão a ser descentralizados os cuidados a pacientes do HIV-SIDA para unidades sanitárias do sector público.
O Hospital de Dia do Centro de Saúde 1º de Maio, que desde o ano 2002 vinha tratando pessoas vivendo com o HIV-SIDA, torna-se assim na terceira unidade de tratamento de doenças crónicas a encerrar na cidade de Maputo, depois dos “Hospitais de Dia” que estavam anexos ao Hospital Central de Maputo e ao Hospital Geral José Macamo.
A directora da Saúde da Cidade de Maputo, Páscoa Zualo Wate, na manhã da última terça-feira, disse ao Canalmoz, à margem da cerimónia de encerramento daquele hospital, que as próximas unidades a serem visadas pela medida de descentralização do tratamento de doenças crónicas, vão ser a do Hospital Geral de Mavalane e do Hospital Geral de Chamanculo, respectivamente.
No Centro de Saúde 1º de Maio, os primeiros doentes foram tratados contra infecções oportunistas pelos Médicos Sem Fronteira da Bélgica, em Fevereiro de 2002. Os primeiros pacientes tratados com antiretrovirais foram ali assistidos em Dezembro do mesmo ano.
Até agora estão cadastrados e a receber tratamento com o apoio da MSF, cerca de 12 mil pessoas vivendo com o HIV-SIDA.
Sobre a sorte dos trabalhadores depois do encerramento daquela unidade, sobretudo os que não fazem parte do Sistema Nacional de Saúde, a directora Páscoa Wate, referiu que “os que trabalhavam para a MSF vão continuar na organização a desempenhar outras actividades no âmbito do apoio que a MSF vai continuar a oferecer ao sector da Saúde. E os do sector de saúde do Estado vão continuar no sistema e a trabalhar nas unidades para onde serão enviados”.
“Esperamos por melhor atendimento para onde nos vão mandar” - Maria Frederica e Agostinho Chipanga, ambos seropositivos
Por seu turno, pacientes ouvidos pela nossa Reportagem e que disseram terem estado a beneficiar de tratamento desde a abertura em 2002 da unidade ora encerrada, foram unânimes em afirmar que com o encerramento do Hospital de Dia do Centro 1º Maio, esperam merecer melhor atendimento e tratamento “nos centros para onde nos vão mandar”.
Segundo disseram “nós, doentes de HIV, vamos continuar a aderir aos tratamentos” nos centros de saúde.
“Médicos Sem Fronteiras não estão a se retirar” – Kelly Cavalete da MSF
Já a coordenadora do Projecto da MSF belga para a área de Mavalane, “a Médicos Sem Fronteiras não está a se retirar, mas, sim, a dar um passo seguinte”.
Segundo esclareceu aquele “Hospital de Dia” tinha sido aberto em 2002 para dar atendimento aos pacientes do HIV-SIDA. “Hoje, com muita vitória, podemos dizer de forma satisfatória que podemos fechar o hospital de Dia, porque já existe apoio em tratamento antiretroviral em quase todas as unidades sanitárias da cidade de Maputo”.
Kelly Cavalete disse também que a cidade de Maputo conta com 28 centros de saúde que fornecem tratamento e atendimento de pacientes de HIV-SIDA. Por isso justificou que o encerramento do Hospital de Dia do Centro 1º de Maio e outras unidades significa que os centros de saúde estão aptos e capazes de receber esses pacientes.
Segundo aquela coordenadora da MSF-Bélgica, a filosofia de hoje é que todo o paciente de HIV-SIDA possa dirigir-se a qualquer centro de saúde mais próximo da sua residência e receber o tratamento da doença.
“A partir de agora, a MSF continua a apoiar o sector de saúde, mas a nível de sistema sanitário público do país e não mais através dos Hospitais de Dia como vinha aconteceu”, disse Kelly Cavalete, em declarações exclusivas ao Canalmoz, à margem da cerimónia de encerramento.
Na sua opinião, a queda dos níveis de financiamento externo nesta área, pode trazer problemas para o sistema público de saúde no atendimento de doentes de HIV-SIDA. Ela garantiu que a MSF vai envidar esforços no sentido de não existir rotura de medicamento até ao próximo ano.
Financiamento externo para HIV-SIDA tem estado a cair
O chefe de Missão dos Médicos Sem Fronteiras - Bélgica, Walter Lorenzi, afirmou no acto de encerramento do Hospital de Dia do Centro de Saúde 1.0 de Maio, que entre 2003 e 2004, as primeiras estratégias de aconselhamento foram implementadas neste local e que as mesmas têm sido utilizadas para produzir as políticas actuais do sector de saúde para esta matéria.
Segundo Walter Lorenzi, em 2004 as primeiras tentativas do Governo descentralizar o tratamento falharam dado que era muito cedo.
As duas grandes mudanças na estratégia de tratamento, de acordo com o chefe da Missão da MSF belga em Moçambique, tem sido a descentralização dos cuidados para os pacientes, e a sua progressiva integração nas unidades sanitárias do sector público, conduzindo ao encerramento dos ‘Hospitais de Dia’.
A MSF considera que a descentralização dos cuidados tem sido autorizada por se considerar os doentes actores do seu cuidado, bem como por se reconhecer ser sua a responsabilidade na adesão, apoio psicossocial e nutricional.
Contudo Walter Lorenzi reconhece que o HIV-SIDA, como no caso de qualquer outra doença crónica, tem exigido que se perca muito tempo na integração em todas as estruturas para se providenciar cuidados. Como em qualquer doença crónica, ao ser implementado o sistema de assistência, requer implementação de equipamentos, treino, instrução e monitoria.
Na verdade, segundo aquela fonte, os fundos dos doadores na área de HIV-SIDA têm estado a reduzir. Por isso a descentralização pode ser uma maneira de aumentar a transferência de tarefas e de atribuição de responsabilidades ao doente estável em seguimento, permitindo com que no início não seja feito somente por médicos.
A MSF considera que não é só a falta de medicamentos ou a gestão da cadeia de abastecimento que importa. É também necessário a expansão do Grupo de Apoio e de Adesão Comunitária (GAAC), permitindo-lhe um reabastecimento fácil de medicamentos se possível para um reabastecimento de 3 meses e não um mês como vem acontecendo até agora.
O chefe da Missão belga da MSF apelou, por um lado, para uma decisão corajosa na integração da tuberculose. Acrescenta que a integração não deve ser apenas uma palavra, não apenas uma integração física, mas deve-se tornar uma integração funcional, onde a mesma pessoa irá cuidar de muitas pessoas afectadas com o HIV e Tuberculose. (Bernardo Álvaro)
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