sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Mistérios do cérebro. O tortuoso caminho do conhecimento


Conhecer as complexas relações entre a cognição (aquisição de conhecimento, percepção), o comportamento humano e as atividades do sistema nervoso sempre foi um desafio para a ciência. Em anos recentes, a tarefa de desvendar esses mistérios vem sendo realizada metodicamente pelos especialistas em neuropsicologia. Nesse campo, reúnem-se estudos de anatomia, fisiologia, neurologia, psicologia, psiquiatria e etologia. Uma das metas perseguidas há séculos tem sido reconhecer a causa de distúrbios da cognição e da especificidade de determinados comportamentos humanos.

Fonte: http://www.estado.estadao.com.br/

A importância dessa pesquisa já era conhecida na Grécia antiga. Era uma época em que o homem passava a ser o centro das atenções da atividade intelectual. Não por acaso, um filósofo foi o introdutor do estudo das relações entre cérebro e comportamento. Alcmaeon, habitante de Crotona, uma cidade grega do sul da atual Itália, dissecou cadáveres e buscou no cérebro o segredo para as atitudes humanas. Na mesma época, a função do cérebro na manutenção da consciência e como controlador dos movimentos já era conhecida por Hipócrates, um dos fundadores da medicina.

No século 18, Franz Joseph Gall (1758-1828), concluiu que as funções mentais seriam localizadas em regiões específicas do córtex cerebral. O anatomista descreve as distinções entre a substância cinzenta e a substância branca do cérebro. Segundo ele, a primeira seria matéria fundamental para as atividades da mente. A comprovação de que áreas específicas do cérebro estavam relacionadas à cognição só ocorreu no século passado. Até então, as idéias localizacionistas eram repudiadas por médicos e psicólogos. Não se acreditava que funções complexas pudessem se concentrar em áreas restritas.

Em 1861, Pierre Paul Broca (1824-1880) descobriu que uma grave lesão na base do terceiro giro frontal esquerdo provocava sérios distúrbios da expressão verbal. O cientista chegou à conclusão, tempos depois, de que essa área era o centro da imagem motora das palavras.

"Foram descobertas que estimularam a abertura de um enorme campo de estudos, capaz de iluminar o porão escuro onde se ocultam alguns dos maiores segredos humanos", afirma o professor Ricardo Nitrini, professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, um dos mais conhecidos e conceituados neurologistas do País. "Esses estudos evoluíram a ponto de hoje investigarmos as mais finas estruturas cerebrais, como a composição molecular das redes neuronais", diz.

Na verdade, o estudo da neurologia reúne hoje a observação cuidadosa de comportamentos, do funcionamento de macro-regiões do cérebro e, por último, de eventos microscópicos que ocorrem nas células. O avanço nessas pesquisas mostrou que o mapeamento das funções cerebrais é mais complexo do que se imaginava.

Hoje, o conceito mais aceito é o de que as funções superiores se engendrem mediante complicados sistemas funcionais. Uma função complexa não depende unicamente de um "centro", mas da ação sincronizada de diversas regiões conectadas entre si. Cada área é, de fato, responsável por uma ou mais atividades elementares, que contribuem de modo específico para um função particular.

Há, portanto, uma intercomunicação entre os diversos "departamentos" do cérebro. Trata-se de um espécie de fábrica, com setores encarregados de funções específicas, mas interdependentes. Um atraso na linha de montagem final de geladeiras pode não ser provocado por um problema com as máquinas ou operários do setor. Pode, na verdade, ter como causa uma falha na área encarregada de abastecer a linha de produção com as portinholas do congelador.

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