Os adoçantes não
calóricos, utilizados para limitar o consumo de açúcar e assim prevenir a
diabetes do adulto e a obesidade, provocam alterações na flora intestinal que
fazem, pelo contrário, aumentar os níveis de açúcar no sangue.
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Milhões de pessoas no mundo deixaram de
pôr açúcar no café e passaram a consumir, por razões de saúde, aspartame,
sacarina ou outros adoçantes artificiais. A indústria alimentar utiliza-os para
reduzir as calorias dos seus produtos. Porém, eles nem sempre são eficazes para
perder peso – um enigma ainda por resolver. E apesar de um sem fim de estudos
terem sido realizados desde a sua introdução na nossa dieta há mais de um
século, os seus eventuais benefícios ou perigos continuam por avaliar.
Agora, uma equipa de investigadores em Israel
descobriu um efeito tangível dos adoçantes sobre a nossa fisiologia. Mais
precisamente, que o consumo de adoçantes é capaz, tanto no ratinho como no ser
humano, de provocar desequilíbrios da flora intestinal – os milhões de milhões
de bactérias que vivem no nosso intestino e nos ajudam a digerir os alimentos.
E que, por sua vez, esses desequilíbrios podem fazer aumentar perigosamente os
níveis de açúcar no sangue – ou seja, precisamente o que se pretendia evitar ao
substituir o açúcar natural por adoçantes. Apesar de serem muito preliminares,
os seus resultados, que foram publicados esta quarta-feira na revista Nature,
levam estes autores a concluir que “a utilização em massa destes aditivos
alimentares deve ser reavaliada” e que "os adoçantes poderão ter
contribuído directamente para exacerbar precisamente a epidemia [de obesidade]
que se destinavam a combater".
O corpo humano é feito de milhões de
milhões de células, mas o número de microrganismos a viver nele, principalmente
bactérias – a "flora", por oposição à "fauna" das nossas
próprias células – é dez vezes maior e estima-se que contenha milhares de
espécies diferentes. A importância para a nossa saúde deste "jardim
botânico" interno, deste "órgão" invisível que pesa cerca de
dois quilos (mais do que o nosso cérebro!) e que vive sobretudo nos intestinos,
começa apenas a emergir.
Eran Elinav, do Instituto Weizmann de
Ciência (Israel) e colegas começaram por descobrir que, embora os adoçantes
artificiais não contivessem açúcar, eles tinham, mesmo assim, um
efeito directo sobre a capacidade de o organismo utilizar a glucose,
explica aquela instituição em comunicado. Ora, a incapacidade de lidar com a
glucose é o primeiro passo a caminho de doenças metabólicas como a diabetes.
Mais precisamente, administraram a
diversos grupos de ratinhos água com diversas doses não tóxicas de três dos
adoçantes mais comuns: aspartame, sacarina e sucralose; e por outro lado, a
outros ratinhos, água pura e água com açúcar. E constataram que os ratinhos que
consumiam adoçantes desenvolviam uma “intolerância à glucose” (níveis elevados
de glucose no sangue), mas não os outros.
A seguir, quiseram saber se a flora
intestinal dos animais estaria envolvida neste fenómeno, especulando que
aquelas bactérias poderiam estar a reagir de maneira imprevista a essas
substâncias artificiais que são os adoçantes. E de facto, quando submeteram
ratinhos a um tratamento com antibióticos destinado a erradicar a sua flora,
cancelaram o efeito dos adoçantes sobre o metabolismo da glucose. Mais: quando
transplantaram flora intestinal de ratinhos que consumiam sacarina para
ratinhos desprovidos de qualquer bactéria própria – e que nunca tinham
consumido adoçantes – esses ratinhos também desenvolveram uma intolerância à
glucose. "Uma prova conclusiva de que as alterações das bactérias
intestinais são directamente responsáveis pelos efeitos prejudiciais [dos
adoçantes] sobre o metabolismo do hospedeiro", lê-se no mesmo comunicado.
Por último, a análise das bactérias
intestinais de animais que consumiam sacarina revelou uma profunda alteração
dessa flora, tanto do ponto de vista da sua composição como das suas funções.
E, em particular, da sua capacidade de metabolizar os hidratos de carbono
contidos na alimentação – que se sabe estar associada a uma propensão para a
obesidade e a diabetes.
Desiguais perante os adoçantes
A questão seguinte foi a de saber se o
mesmo aconteceria nos seres humanos. Primeiro, os cientistas analisaram dados
nutricionais relativos a cerca de 400 pessoas e descobriram uma relação entre o
consumo de adoçantes, o perfil individual da flora intestinal e a propensão
para ter níveis de glucose elevados no sangue. E depois, fizeram uma pequena
experiência, em que sete voluntários que em geral não consumiam adoçantes nem
comida artificialmente edulcorada passaram a fazê-lo durante uma semana,
enquanto os cientistas monitorizavam os seus níveis de glucose e a composição
da sua flora intestinal. “Passados apenas quatro dias, metade dessas pessoas
apresentava níveis elevados de glucose no sangue e perturbações da tolerância à
glucose”, comentam dois especialistas norte-americanos num artigo na mesma
edição da Nature.
Imagem: Milhões de milhões de bactérias
(filamentos brancos) cobrem as paredes do intestino Instituto
Weizmann de Ciência
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