sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Viajem ao epicentro da tuberculose resistente. (Fim)


Em algum lugar de Tomsk, um paciente com tuberculose espirra: acaba de contagiar a outras 15 pessoas

MARÍA VALERIO ELMUNDO.ES
(enviada especial a Tomsk, Rússia).

Que esta patologia respiratória é um desafio na Rússia, sublinha-o Vladislav Yerokhin, membro da Academia de Ciências Médicas do país e director do Centro de Investigação de Tuberculose de Moscovo. "Num ano, os casos de infecção mais difíceis de tratar passaram de 10,3% dos novos diagnósticos em 2007 a 38,4% em 2008". A região siberiana de Tomsk escapa a esta tendência nacional, graças ao empenho das autoridades locais. "Por cada paciente que morre, logramos curar a outros 14", assinala orgulhoso Sergey Mishustin, à frente do serviço de luta contra o VIH da região de Tomsk. O mesmo reconhece, incluso ainda possa parecer pouco ortodoxo, que façam qualquer coisa como tal de que se cumpra com o tratamento; até deixar aos pacientes que se tomem as pastilhas junto com um trago de vodka.

Junto com VIH

A aparição em cena de um vírus moderno como o da imunodeficiência humana (VIH) converteu-se no melhor aliado para facilitar a persistência desta infecção respiratória, que convive com a Humanidade desde a Antiguidade. A debilitada situação imune dos pacientes com VIH converte-os em vítimas fáceis da tuberculose e em alguns países a taxa de co-infecção chega a ser até de 75%. "Aproximadamente um terço dos 33 milhões de portadores do VIH está co-infectado pelo bacilo de Koch", resume o professor Lee Reichman, da Universidade de Nova Jersey (EUA), o que representa um total de 10 milhões de pessoas em todo o mundo.

Marina Britvenko é uma destas vítimas duplas do VIH e da tuberculose. Na actualidade dirige em São Petersburgo a ONG Piterski Mosk, que ajuda na reabilitação de pessoas alcoólicas; mas faz cinco anos souberam que ademais do vírus da sida, tinha tuberculose. "A sensação ao conhecer o diagnóstico foi igual, dura em ambos os casos", reconhece esta activista apaixonada.

Ela quer ser «um exemplo visível» de que o tratamento funciona («não tive nenhuma recorrência em cinco anos»), mas reconhece que ao princípio não quis ir ao médico por temor à rejeição, pelo estigma que ainda acompanha esta infecção respiratória, que segue associada maioritariamente a grupos vulneráveis, como os usuários de drogas, os alcoólicos ou as prostitutas. "A minha surpresa ao chegar ao hospital é que não me encontrei com nenhuma mirada de rejeição", anota.

Relata semana a semana todos os efeitos físicos que a infecção lhe foi causando (perda de apetite e de peso, dor nos pulmões, febre, vómitos...) e como cumpriu à tábua rasa os seis meses de tratamento que lhe salvaram a vida. De facto, como acrescenta Reichman, a tuberculose é a primeva causa de morte entre os seropositivos e, sem os antibióticos apropriados, 90% deles morre em apenas poucos meses.

Pelo contrário, em pacientes seronegativos, quando a infecção responde aos tratamentos, a mortalidade apenas roça o 1% e estas pessoas podem desfrutar de um bom prognóstico de vida. É o caso de Olga (30 anos) ou Natália (26 anos). As duas são jovens profissionais, enfermeira e publicista, respectivamente, que desconhecem como puderam contagiar-se da tuberculose que lhes obriga a medicarem-se no centro de dia da sua cidade.

Ambas compartem a sensação de vergonha e estigma que tiveram ao conhecer o diagnóstico, ambas tiveram que deixar o seu trabalho por culpa da enfermidade e ambas coincidem rotineiramente no centro para tomarem os antibióticos. "Duas vezes ao dia, vamos tomar as pastilhas junto com a comida", explicam na luminosa sala de espera, rodeadas de enfermeiras mascaradas que podem chegar a atender a umas 170 pessoas ao dia. Elas cumprem rigorosamente a sua rotina de acudir a pôr as pastilhas mas, a julgar pelas cifras, muitos pacientes não o fazem. Em algum lugar de Tomsk, um paciente com tuberculose espirra: acaba de contagiar a outras 15 pessoas.

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