Você já deve ter ouvido falar que tomamos
antibióticos demais, e que o abuso desse tipo de medicamento pode levar a mais
problemas do que soluções (pesquisas
americanas mostram que pediatras prescrevem mais de 10 milhões de antibióticos
desnecessários todos os anos para crianças).
Em primeiro lugar, porque quanto mais antibióticos
nós tomamos, mais as bactérias se acostumam com eles. De acordo com a
Organização Mundial da Saúde (OMS),
o mundo está entrando em uma crise de resistência a antibióticos, que pode
acabar com a medicina moderna: no futuro, todo antibiótico comum pode se tornar
inútil.
Além disso, outra afirmação é bastante corriqueira:
a de que os antibióticos não matam apenas as bactérias más, como as boas
também.
Opa! Que bactérias boas? As que vivem no nosso organismo
e que nos ajudam com tarefas importantes todos os dias.
Muitas
comunidades de bactérias vivem em nós – o suficiente para encher um prato
grande de sopa, ou 1,36 a 2,27 quilos de bactérias. Na verdade, tem mais
bactéria do que “a gente mesmo” em nosso corpo: as células de bactérias superam
as células humanas em 10 para 1 no nosso organismo. Porém, como elas são muito
menores do que as células humanas, representam apenas cerca de 1 a 2% da nossa
massa corporal (embora componham cerca de metade dos nossos resíduos
corporais).
As bactérias gastrointestinais estão entre as mais
importantes do nosso corpo. Isso porque elas nos ajudam a coletar a energia dos
alimentos ao quebrar as moléculas complexas que nossas células não conseguem
quebrar. Elas também constroem vitaminas que não podemos fabricar, e
“conversam” com nosso sistema imunológico para que ele funcione corretamente,
evitando invasões de outros micróbios mais prejudiciais. Enfim, as bactérias
são nossas parceiras e, sem elas, com certeza algumas coisas iriam mudar no
nosso corpo.
Até o
nosso peso
O resultado de uma observação com animais despertou
a curiosidade de cientistas quanto aos efeitos do antibiótico no corpo humano.
Há mais de 50 anos, fazendeiros percebem que baixas
doses de antibióticos em animais saudáveis engordam seu gado em até 15%. Isso
funciona com vacas, ovelhas, porcos e galinhas, e com qualquer remédio, como
penicilinas ou tetraciclinas. O efeito é sempre o mesmo: mais peso.
Para descobrir o porquê de tal efeito, Ilseung Cho,
da Universidade de Nova York (EUA), deu antibióticos para ratos jovens, e
concluiu que as drogas mudaram drasticamente as comunidades microscópicas de
seus organismos, aumentando a quantidade de calorias que eles “colhiam” dos
alimentos. O resultado: os ratos se tornaram mais gordos.
Cho usou uma gama de antibióticos diferentes,
incluindo penicilina, vancomicina, os dois juntos, ou clortetraciclina. Após 7
semanas, os ratos tratados não ficaram mais pesados, mas ganharam mais gordura
corporal – cerca de 23%, em comparação com os típicos 20%.
As comunidades bacterianas dos ratos medicados
também mudaram. Eles tinham os mesmos números de micróbios, mas possuíam mais
bactérias do filo Firmicutes, e menos do filo Bacteroidetes.
Esse padrão é interessante, pois muitos estudos
descobriram que o equilíbrio entre estes dois grupos de bactérias pende a favor
das Firmicutes em indivíduos obesos.
Os antibióticos também mudaram a forma como as
bactérias agiam. Nos ratos tratados, certos genes eram mais ativos, incluindo
aqueles que quebram os carboidratos complexos em ácidos graxos de cadeia
(substâncias que fornecem energia para as células intestinais e desencadeiam a
produção de gordura do corpo). Genes envolvidos no armazenamento de calorias
não utilizadas, criando substâncias como gorduras e triglicérides, também
tendiam a ser mais ativos.
Conclusão
O efeito foi visto com todo e qualquer antibiótico.
Isso significa que o uso desse remédio pode alterar as comunidades bacterianas
e a forma como elas agem, fazendo o organismo colher mais calorias dos
alimentos e acumulá-las mais em gordura.
Mas, como o estudo foi realizado com ratos, que,
apesar de parecidos conosco, têm comunidades bacterianas e organismos
diferentes, os pesquisadores ainda não podem afirmar que as alterações são
iguais em nós.
No entanto, um passo já foi dado para provar que o
mesmo deve estar acontecendo conosco: um segundo estudo de Martin Blaser, que
liderou a pesquisa de Cho, seguiu 11.532 crianças britânicas nascidas entre
1991 e 1992, e mostrou que aquelas que tomaram antibióticos nos primeiros seis
meses de vida também ganharam mais peso nos primeiros anos de vida.
“O uso excessivo de antibióticos pode estar
alimentando o aumento dramático de condições como a obesidade, diabetes tipo 1,
doença inflamatória intestinal, alergias e asma. Devemos fazer uso da
tecnologia disponível para proteger e estudar os nossos benfeitores bacterianos
antes que seja tarde demais”, disse Blaser.[DiscoverMagazine]
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