O mistério da percepção das cores tem chamado a atenção de filósofos, físicos, biólogos e escritores há séculos. Não por acaso, o assunto mereceu especial atenção de sábios e pesquisadores influenciados pelo Iluminismo. O alemão Johann Wolfgang Goethe (1749-1832) escreveu seu tratado sobre as cores impressionado com a incompatibilidade entre as teorias clássicas e a realidade. Goethe reconheceu e analisou, no final do século 18, alguns fenômenos que seriam identificados quase duzentos anos depois.
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O escritor cientista notava a persistência mágica de imagens na retina e as ilusões produzidas pela cor e por outros estímulos visuais. Goethe estava preocupado com a maneira como vemos a realidade, como a transformamos em registros particulares do mundo externo. Segundo ele, esses fenômenos não são explicados pela física de Newton, mas pelo funcionamento interno do cérebro. Para o escritor, "a ilusão de óptica é a verdade óptica".
O escrito de Goethe foi muito criticado na época, tido como uma espécie de exercício pseudocientífico. Outro alemão, Hermann von Helmholtz (1821-1894), entretanto, daria novos subsídios aos adeptos da teoria da ilusão das cores. O cientista demonstrou que, no processo de percepção, as cores dos objetos são preservadas mesmo com grandes e significativas alterações no comprimento de onda que os iluminam.
O comprimento de onda da luz que ilumina uma banana, por exemplo, varia de acordo com a fonte de luz e a posição do observador. No entanto, a fruta permanece sempre amarela. Esse fenômeno não poderia ser uma simples transformação dos dados do comprimento da onda em cor. Helmholtz concluiu que deveria haver uma "inferência consciente", um processo de correção automática dos dados recebidos, uma maneira interna de organizar o caos de estímulos e dar-lhes um significado.
Em 1957, Edwin Land (1909-1991), o inventor da Polaroid, realizou uma formidável demonstração teórica da ilusão das cores. Fez duas imagens em preto e branco da mesma cena, usando dois filtros: um vermelho e outro verde. Depois projetou a primeira imagem com filtro vermelho e, sobre ela, a segunda, com luz branca comum. Esperava-se uma imagem em tons caóticos de rosa. Mas, para surpresa geral, brotou na tela uma moça com cabelos loiros, casaco vermelho e perfeitos tons naturais de pele.
O teatro das células cerebrais - A experiência não pôde ser satisfatoriamente explicada na ocasião e não rendeu novos conceitos científicos. Para muitos, no entanto, provava a teoria de Goethe, da ilusão das cores. O azul e o vermelho não estão lá, de fato, mas são impressões criadas pelo cérebro.
Um dos mais respeitados neurocientistas do mundo, o doutor Rodolfo Llinás, da Escola Médica da Universidade Nova York, acredita que a consciência é mero resultado de sinais elétricos coordenados. Usando um magnetoencefalógrafo, que mede correntes elétricas dentro do cérebro, Llinás mediu a resposta a estímulos musicais. Segundo ele, vários grupos de células saltam para cima e para baixo, ao mesmo tempo, de acordo com a especificidade do estímulo externo.
São padrões simultâneos e também coordenados de funcionamento da estrutura cerebral. Llinás afirma que a máquina de pensar funciona 24 horas por dia na construção de modelos de percepção do mundo e de recriação da realidade captada. As cores não existem fora de nosso cérebro. O som nada mais é que a relação entre determinadas vibrações externas e o cérebro.
"Acordados ou durante o sono, vivemos em um estado de sonho", costuma afirmar. Embora nossas impressões sejam bastante semelhantes a determinados aspectos da realidade externa, nada podemos falar sobre uma realidade objetiva. Criamos nossas cidades com o trabalho das mãos, mas as vemos segundo os caprichos do cérebro. No grande teatro da vida, vemos apenas as peças que as células do cérebro decidem representar.
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